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quinta-feira, 7 de junho de 2012

DAS LAGOAS PARA AS INDÚSTRIAS

Pergunte a um operador de turbinas hidrelétricas o que ele acha dos aguapés e provavelmente a resposta será – #*&*#! – impublicável. Faça a mesma pergunta a um encarregado de uma estação de tratamento de água e a resposta seguirá no mesmo calão.

 

Eles têm lá suas razões: algumas espécies de aguapés, como o super comumEichhornia crassipes, podem se multiplicar rapidamente, tanto por meios vegetativos, como por frutos e sementes abundantes. Então infestamreservatórios, canais de irrigação, rios de fluxo lento e lagoas. Em alguns casos, chegam a cobrir por completo a superfície e roubam a luz das algas que oxigenam a água, causando a redução do oxigênio dissolvido e a morte dos seres aquáticos que dele dependem.

 

Em pouco tempo, o excesso dessas plantas também acidifica a água, devido à concentração de matéria orgânica em decomposição. A acidez é fatal para asturbinas e outros equipamentos utilizados pelo homem, daí o praguejar dos operadores, reforçado pelo fato de os aguapés também entupirem canos, dutos e outras passagens.

 

Mas aguapés também têm seus defensores. Pelo fato de absorverem poluentes inorgânicos, como metais pesados, e orgânicos, como os presentes nos esgotos domésticos, eles são usados na filtragem de corpos d’água poluídos. O processo é simples: basta deixar os aguapés se multiplicarem e aos poucos eles absorvem e retêm os poluentes. Aí é só retirar os aguapés da água e… fazer o quê com aquela montanha de plantas em decomposição, embebidas em poluentes?!

 

O engenheiro químico José Dilcio Rocha, pesquisador da Embrapa Agroenergia tem uma excelente alternativa: transformar tudo em bio-óleo. Expert em bioenergia, ele trabalha com isso desde 1998 e já foi pesquisador visitante ou consultor em diversas instituições, como a Universidade de Strathclyde, em Glasgow, na Escócia; o National Renewable Energy Lab, no Colorado, EUA, e o Centro Nacional de Referência em Biomassa, Cenbio, em São Paulo. E considera o aguapé uma das boas fontes de biomassa disponíveis para produção de bio-óleo. As outras são serragem, resíduos da produção comercial de eucaliptos, resíduos agrícolas e lodo de estações de tratamento de esgotos.

 

O bio-oléo pode ser produzido a partir de um desses resíduos ou da mistura deles. E os aguapés eventualmente utilizados não precisam ser de uma espécie só ou apenas de reservatórios poluídos: José Dilcio também participou de um grupo multinstitucional –Embrapa, Universidade Estadual de Campinas-Unicampe a empresa Bioware – que avaliou a viabilidade de produção do bio-óleo a partir das ilhas flutuantes de aguapés que descem pelos rios do PantanalMatogrossense durante as cheias, conhecidos por lá como camalotes.

 

“O aguapé é uma fonte de biomassa genuinamente brasileira e faz parte de um grupo de materiais que ninguém quer, mas tem vários aproveitamentos”, pondera José Dilcio. “Esses materiais podem e devem ser usados para alimentar processos industriais ‘flex’ (numa referência aos automóveis que funcionam com dois tipos de combustível)”.

 

Segundo o especialista, os resíduos são degradados termicamente em um reator até virarem vapor, depois condensado para a obtenção do óleo. Esse processo chama-se pirólise e pode ser realizado em instalações relativamente simples. Isso viabiliza a montagem de reatores onde quer que estejam as montanhas de resíduos, dispensando o transporte da matéria-prima até uma instalação industrial.

 

Em geral, a temperatura do reator fica entre 450 e 550 graus centígrados, o que é considerada uma temperatura moderada em instalações industriais.

 

“Podemos obter, ao mesmo tempo, energia e um combustível sintético renovável. O gás produzido no processo pode realimentar o próprio reator e o bio-óleo serve para diversos processos industriais, substituindo derivados de petróleo”, acrescenta José Dilcio. No caso do aguapé, 60% da matéria-prima vira bio-óleo e sobra de 25 a 30% como um pó de carvão. Que também tem utilidade, diga-se de passagem, como condicionante de solo para retenção de água ou para a fabricação de fertilizantes de lenta liberação. O restante vira vapor, sem emissões de gases-estufa, sem queima de combustíveis fósseis.

 

Não sei, não, mas se a indústria apostasse no bio-óleo de aguapé (e outros resíduos) como o setor de transportes aposta no etanol de cana-de-açúcar, o Brasil seria até capaz de fazer bonito nas penosas negociações sobre Mudanças Climáticas

 

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